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quarta-feira, 23 de março de 2016

Mulher?

(...)
Hoje eu acordei cedo pra preparar o café. Claro, antes que todos acordassem e fazendo o mínimo de ruído possível pra que meu esposo pudesse levantar disposto para trabalhar, afinal eu não trabalho fora. 
Coloquei a água no fogo, fervi o leite e aproveitei pra lavar umas louças que estavam na pia do jantar de ontem. Quando tudo ficou pronto, fui até a padaria e comprei pães frescos e quentes.
O despertador tocou. Meu esposo se levantou e não viu seu uniforme em uma mesinha que eu havia acabado de passar. Enquanto tomava banho, peguei as peças e levei até o banheiro pra ele.
Meu filho mais velho, de 6 anos também se levantou para ir ao colégio. Minha filha, com 2 anos de idade, continua comigo. Minha companheira.
Os dois tomaram café. Ao saírem, aproveitei que Alice ainda dormia e lavei um tanque com roupa pra aproveitar o sol. Sabe como é, no verão sempre tem tempestades no fim da tarde e como lavo tudo na mão, nem secariam se eu deixasse pra mais tarde.
Fui pro quarto do meu filho. Organizei seu armário, limpei os móveis, o chão. Passei para o meu, Alice acordou. Ela é um doce, mas gosta de atenção. Brinquei um pouco, mas ela sempre insiste em querer mais. Já era hora do almoço, precisava fazer comida, afinal, eu não trabalho fora.
Desliguei as panelas e meu esposo chegou. Eu havia esquecido, ele não gosta de comida quente. Depois de uma manhã intensa no trabalho, acabou sendo rude comigo e ... bom, apanhei mais uma vez.
Dizem que o primeiro tapa a gente nunca esquece. Eu fingi que esqueci. Era um dia frio, e eu havia lavado um casaco dele e não secou a tempo pra ele trabalhar e eu entendo...ele estava nervoso.
Após ele almoçar, dormiu um pouco no sofá enquanto eu limpava a cozinha e enxugava minhas lágrimas. Eu tinha jurado que nunca mais apanharia. Seria o dia perfeito pra mudar de vida.
Alice puxou a barra do meu vestido. Pedro chegou da escola. Ambos, com sorrisos que aquecem minha alma toda vez que ela fica fria.
Eu deixei de estudar pra ser mãe. Larguei meu emprego quando engravidei. Não tenho casa própria. Meus pais faleceram e meus amigos...simplesmente dizem que gosto de apanhar.
Talvez quando crescerem. Talvez eu tome coragem de escapar. Mas agora?
Tenho roupas para passar, casa para limpar, e verbos para conjugar em segredo nos meus sonhos sobre a minha realidade.

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